Os atos bolsonaristas no feriado da Independência foram transmitidos pelas redes de TV ao longo da quarta-feira (7/9) e ganharam grande atenção dos portais de notícia, além de terem potencial para continuar sendo assunto nos próximos dias. Toda essa exposição é uma vitória para a campanha à reeleição de Jair Bolsonaro (PL) na visão tanto de aliados quanto de adversários – que agora precisam reagir a um assunto agendado por um candidato que, até então, estava na defensiva, respondendo a acusações.
As imagens de ruas cheias em Brasília, Rio e São Paulo vão virar material de campanha para Bolsonaro, que tentará reforçar a confiança de aliados e militantes, mesmo diante de um cenário eleitoral desfavorável, segundo apontam as pesquisas. A menos de um mês do primeiro turno, marcado para 2 de outubro, o presidente busca argumentos para convencer seus militantes de que ainda pode protagonizar uma virada inédita desde a redemocratização do país.
Ainda que o presidente tenha escorregado em polêmicas machistas e sexistas em seus discursos, como quando puxou o coro de “imbrochável” em Brasília, seus aliados consideraram que o saldo das falas foi positivo. Isso porque não houve ataques diretos a autoridades ou críticas sem provas ao sistema eleitoral. Sem esses ingredientes, calculam os articuladores da campanha, não há espaço para uma resposta institucional que gere uma onda de notícias negativas, como a que ocorreu após o 7 de Setembro de 2021 ou depois da live com embaixadores, em junho deste ano.
Reação do PT e dos demais adversários
O ganho de Bolsonaro com os atos de 7 de Setembro pode ser verificado pela reação de seus adversários na eleição, que repercutiram e rebateram seus discursos.
A emedebista Simone Tebet, por exemplo, classificou a fala do presidente em Brasília como “vergonhosa e patética”. “No Dia da Independência do Brasil, o presidente mostra desprezo pelas mulheres e sua masculinidade tóxica infantil”, disse a candidata. “Como brasileira e mulher, me sinto envergonhada e desrespeitada. Além de pária internacional devido à falta de segurança e estabilidade política, agora o país também vira motivo de chacota pelas falas machistas do seu líder, que deveria dar exemplo. O Brasil não merece o governo que tem”, completou a senadora.
Já Ciro Gomes (PDT) afirmou que “Bolsonaro transformou o 7 de Setembro dos 200 anos da Independência no mais desavergonhado comício eleitoral já feito neste país”, com “transgressões políticas, institucionais e morais seriíssimas”.
Na campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a avaliação é parecida com a de Ciro: de que Bolsonaro pode ser acusado de desrespeito à legislação eleitoral. Politicamente, porém, os petistas pretendem reagir dizendo que o evento do Bicentenário da Independência foi esvaziado de seu valor institucional, “com chefes de Estado trocados pelo ‘véio’ da Havan”, na análise de uma fonte da campanha.
Os petistas consideram ainda que podem apelar para o orgulho dos militares, pois teriam recebido sinais de que há incômodo entre os fardados pelo uso político de um importante evento cívico.
A maneira de explorar o assunto nos programas de TV e no discurso de Lula, porém, ainda está sendo debatida pelo núcleo da campanha petista.
Expectativa pelos efeitos eleitorais
A repercussão dos atos de 7 de Setembro é tratada pela campanha de Bolsonaro como uma chance para fazê-lo reagir nas pesquisas, nas quais tem aparecido estacionado há semanas.
Para o cientista político João Villaverde, professor e pesquisador do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da FGV-SP, porém, as manifestações não foram um “fato novo” capaz de mudar a trajetória da campanha. Para ele, Bolsonaro pregou para os convertidos e não conseguiu furar sua bolha.
“Mas, diferentemente do que aconteceu no ano passado, é improvável que Bolsonaro tenha aumento de rejeição adicional por conta do ato de hoje”, afirma ele, completando que a saída do ex-ministro Sergio Moro da disputa presidencial, em abril, havia sido, até então, o último fato que realmente deu força e pontos a Bolsonaro.
Por outro lado, o cientista político Rui Tavares Maluf, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), acredita que “ainda tem jogo” nessa campanha e que Bolsonaro dispõe de elementos para se mostrar competitivo, apesar das pesquisas.
“Mas, para manter a chama acesa, é preciso que o candidato deixe de lado, definitivamente, o embate com as instituições e se concentre em vitórias econômicas do governo, em dados positivos. As mensagens para o público dele já foram suficientemente claras, ele precisa ampliar”, pontua o especialista, que reconhece que Bolsonaro conseguiu imagens importantes para a campanha no 7 de Setembro.
Tavares Maluf, no entanto, concorda com João Villaverde sobre a dificuldade de fazer o evento furar a bolha de um eleitorado já garantido. “Poderia ter sido pior se ele tivesse atacado abertamente o Supremo e as urnas, mas o tom do discurso ainda foi mais negativo do que positivo. A vulgaridade não contribui para ampliar a audiência”, avalia o cientista político.
Para o professor, porém, Bolsonaro conseguiu ao menos abrir caminho para mudar de assunto e ter de responder menos questionamentos relacionados a imóveis comprados em dinheiro vivo por sua família ou aos ataques a jornalistas mulheres.
“A eleição ainda tem Lula como favorito, mas segue aberta, com alguma incerteza. Na minha opinião, esse cenário mostra a força e a beleza da democracia, que, mesmo num momento em que é ameaçada, ainda nos possibilita uma disputa eleitoral aberta e emocionante”, conclui Tavares Maluf.
Metrópoles